MANDELA E O RUGBY PELA UNIÃO DE UM PAÍS
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![Mandela entrega a taça ao capitão dos Springboks. FOTO: Getty Images](http://www.blogstartsports.com.br/wp-content/uploads/2015/06/Mandela-Copa-Rugby.jpg)
No dia 24 de junho de 1995, a África do Sul vencia a histórica final da Copa do Mundo de rugby por 15 a 12 em cima da favorita Nova Zelândia. Esse jogo é considerado um dos maiores jogos da história da modalidade e a atuação do fly half Joel Stransky, autor de todos os pontos da equipe, tida como quase perfeita. O Ellis Park, em Johanesburgo, recebeu 62 mil espectadores, mas foi como se recebesse um país inteiro. E o responsável foi Nelson Mandela.
Para entender o quanto o evento foi emblemático, precisamos contextualizar o momento da África do Sul. Em 1948, foi implementado o Apartheid (que no idioma africânder significa “vida separada”), um regime que retinha o poder político e econômico com os brancos e obrigava os negros a viverem separados, sem garantia nem de direitos básicos do cidadão. Além da segregação racial no cotidiano da sociedade, os negros eram proibidos de integrar qualquer seleção nacional.
![Divisão racial explícita em locais públicos. FOTO: crative commons](http://www.blogstartsports.com.br/wp-content/uploads/2015/06/a10.jpg)
Cabe ressaltar que, dentre os quatro principais esportes do país – rugby, críquete, futebol e boxe – o rugby era diretamente associado à elite branca, que era quem mais o praticava, e foi usado como referência esportiva durante o regime. Os negros eram minoria e jogavam em ligas paralelas. No futebol, os sul-africanos chegaram a pedir a FIFA que autorizasse o país a jogar as eliminatórias da Copa de 70 com duas seleções: uma de brancos e outra de negros. Vetado. Aliás, esse foi um dos motivos, aliados a falta de apoio do governo ao esporte, que fez com que a FIFA e o COI banissem o país de competições internacionais e de seus quadros de membros. A atitude demorou, pois só foi tomada em 74. Já a International Rugby Board não os baniu, mas proibiu a seleção do país de jogar torneios internacionais.
Bom, aí veio o ano de 1990, quando Flederik de Klerk, então primeiro ministro, declarou o fim do regime, mediante grande pressão da opinião pública. Foram quatro anos de difíceis reformas políticas e muita instabilidade no país, inclusive com províncias como Cabo, Orange, Transvaal e Bantustões, chegando a beira de declarar independência. Foi um árduo caminho até as eleições de 94, as primeiras livres e multirraciais. O eleito foi Mandela.
Madiba, como era conhecido, saiu da prisão com o fim do apartheid, depois de 27 anos de cárcere. Ele foi um dos líderes da reunificação social e racial do país, tornando-se o primeiro presidente negro da África do Sul. Teve que lutar contra o aumento da pobreza e do crime no país, mas principalmente construir uma unidade nacional, depois de tanto tempo de segregação. Aí chegamos à seleção de rugby.
![Mandela, após sair da prisão, em 1990. (FOTO: Alexander Joe/AFP/Getty Images)](http://www.blogstartsports.com.br/wp-content/uploads/2015/06/20136241239191133_8.jpg)
Por que não usar o futebol o boxe, esportes de maioria negra? A escolha veio de um jogo dos “Springboks” – nome dado a seleção sul-africana. Mandela foi ao estádio e notou que os negros na arquibancada torciam contra a seleção do próprio país, assim como ele fez em relação ao governo, enquanto esteve preso. Notou que não era o caminho para um país que queria se unir. Nada melhor que usar um esporte, que até então era essencialmente branco, para exemplificar a nova face do país. Com o fim do Apartheid, o país voltou a disputar competições internacionais e, de quebra, foi escolhido sede da Copa do Mundo de Rugby de 95. Mandela viu no evento a chance de ouro que precisava.
Mandela conversou pessoalmente com o capitão dos Springboks, François Pienaar, lhe explicando seu pensamento e a importância do título para o país. O time que antes era apenas de brancos, passou a contar com o negro Chester Williams, que substituiu um companheiro lesionado e foi crucial no torneio. Com sua entrada, o time passou a ser a primeira representação multirracial da África do Sul em uma competição esportiva internacional. Estava tudo pronto.
O time que começou com derrotas e desconfiança foi se fortalecendo e unindo o país. Chegou forte à Copa do Mundo, mas a missão era árdua. Na primeira fase, três vitórias contra Austrália (27×18), Romênia (21×8) e Canadá (20×0). Nas quartas-de-final, uma vitória fácil sobre Samoa Oriental (42×14) e nas semi-finais um duelo sensacional com os favorito franceses, vencido por 19×15. Na final, o esperado: o poderoso time da Nova Zelândia, os All Blacks. Na primeira fase, os neozelandeses venceram o Japão por 145×17, o maior placar de mundiais, com direiro a 45 pontos de Simon Culhane, recordista também neste quesito. Além dos japoneses, os All Blacks não tomaram conhecimento de galeses, irlandeses, escoceses e ingleses, chegando com relativa facilidade às finais.
Na histórica final, tida por muitos como a melhor de todos os tempos, nem o fenômeno neozelandês Jonah Lomu – craque do torneio – conseguiu impedir a vitória dos Springboks. Na prorrogação, por 15×12, um país derrotou o outro dentro de campo. E fora dele a união derrotou o preconceito racial. Quando Mandela entregou a taça a Pienaar, foi muito mais do que o primeiro título do país em Copas do Mundo. Foi a primeira celebração de união entre negros e brancos por um único ideal em terras sul-africanas. Graças a Mandela e ao rugby.
Uma boa maneira de conhecer a história, ressalvado algumas licenças poéticas é o filme “Invictus” de Clint Eastwood. A propósito, se colocassem o Morgan Freeman no lugar do Mandela era capaz que ninguém notasse a diferença.
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