O DIA EM QUE O CHILE ATROPELOU O BRASIL EM CÓRDOBA
É curioso como o conceito de vexame pode ter parâmetros diferentes, principalmente quando se trata de seleção brasileira de futebol. Resolvemos escolher um jogo de Copa América para rever e nos deparamos com uma massacre do Chile sobre o Brasil. A escolha então foi fácil.
O jogo em questão era o último da primeira fase da Copa América de 87, em Córdoba, na Argentina. Brasil e Chile decidiam a vaga do grupo B, com o time canarinho precisando apenas de um empate.
Era uma fase de transição. O Brasil vinha de uma fatalidade na Copa do Mundo de 86, que encerrou a era de Tele Santana, e apostava em Carlos Alberto Silva para renovar seleção. A base ainda era mantida, mas o time contava com novos nomes surgidos no pré-olímpico e tinha como camisa 10 o Edu Marangón, da Portuguesa. Isso mesmo, amigos. Era uma época em que a Lusa representava bem mais.
Córdoba era uma cidade fria naquela noite. Os chilenos que ficaram no banco, entre eles Iván Zamorano, precisaram da ajuda de um cobertor. Dentro de campo o Brasil tratou de esquentar o jogo.
Era uma época em que não havia marcação sobre pressão e os times esperavam o adversário para sair para o contra-ataque. Logo aos 3 minutos, o zagueiro Astengo – então no Grêmio – meteu a mão na bola. Júlio César desperdiçou a falta. Aos 9, foi a vez de Muller bater cruzado e Rojas operar um milagre.
Aliás, Rojas seria o nome do jogo. O então desconhecido goleiro – que faria história no São Paulo – teve que encarar o matador Careca, do Napoli, aos 15. Dessa vez não deu para ele, mas o atacante isolou a bola na marca do pênalti.
As trocas de passe entre Valdo e Raí – que ainda era jogador do Botafogo de Ribeirão Preto O.o – encurralavam os chilenos. Aos 19, Careca perdeu mais um, dessa vez de cabeça. Aos 20, Júlio César desviou escanteio e Rojas salvou de canela. Enquanto isso o Chile seguia recuado e só tinha chutado uma falta, completamente sem perigo.
Revendo a transmissão da Rede Globo, além da presença de Carlos Alberto Torres nos comentários, o que chamou atenção foi a nostalgia das chamadas da Fórmula 1. Naquele fim de semana aconteceria um GP da França, que marcaria mais um duelo entre Piquet e Senna. Bons tempos, mas não vem ao caso.
Aos 25, Rojas parou Muller mais uma vez, após uma bola escorada que o atacante finalizou de primeira. O lance pareceu acordar o Chile que subiu e teve duas chances, que finalizou sem nenhum perigo. O jogo esfriou com a contusão de Marangón, que parou a partida. Tempo para notar um simpático sujeito na lateral do campo, devidamente credenciado, com a bandeira do Botafogo. Ele até mandou um joia para a câmera. Terá ido torcer por Raí?
O jogo seguiu morno até os 41, quando a zaga brasileira falhou num cruzamento na área e viu Basay subir livre para abrir o placar. O Brasil foi muito superior mas acabou castigado. Raí isolou a última chance do primeiro tempo aos 45 e o time foi pro intervalo surpreendido pelo desacreditado Chile.
Curiosamente a substituição feita no intervalo foi a entrada de Geraldão no lugar de Ricardo Rocha. Justificável ou não, foi desastrosa. O Brasil subiu desembestado para o ataque e numa bola lançada, aos 2 minutos, Geraldão falhou logo no seu primeiro lance e deixou Letelier livre, para encobrir Carlos e ampliar.
O Brasil estava desnorteado. Nem parecia a equipe que dominou o início do jogo. Mas ainda assim produzia chances claras. Careca arrancou e chutou cruzado para Muller, que não alcançou. Carlos Alberto Silva lançou o jovem Romário para partir para o tudo ou nada, mas a coisa ainda piorou. Depois de Carlos pegar o chute de Puebla, o Brasil subiu para o ataque, perdeu a bola e Nelsinho, que foi expulso após dar um pontapé no chileno.
Mesmo com tudo dando o errado, as chances teimavam em aparecer. Aos 14 minutos, Careca cabeceou na trave e no rebote Muller perdeu. Dois minutos depois, novamente Careca viu a trave parar seu voleio. Não era o dia do Brasil. Já do Chile…
Aos 18, Carlos impediu o gol de Letelier, mas aos 19, viu Basay marcar de novo, completando um escanteio livre, sem marcação alguma. A zaga do Brasil parecia uma peneira. Dois minutos depois o Chile entrou tocando e se não fosse a defesa de Carlos, Contreras teria feito o quarto. A defesa simplesmente assistia ao jogo.
O cruzeirense Douglas teve que ir para a lateral e a seleção brasileira ficou sem meio-de-campo. Os jogadores brasileiros escorregavam e com o time avançando desesperado, a zaga se tornou uma avenida. Aos 24, Carlos teve que sair para dividir com dois atacantes livres, para impedir mais um gol.
Para entrar para história, o Chile aproveitou a defesa desmantelada, entrou tabelando e matou o jogo, com outro gol de Letelier. Era impensável. O favorito Brasil foi surrado pelo Chile, que até então só havia vencido a seleção canarinho em cinco oportunidades.
Enquanto o técnico chileno se deu ao trabalho de poupar seus dois goleadores, Rojas apareceu de novo, para impedir o gol de Romário e ainda saiu no pé de Careca. Depois disso, nada mais aconteceu. Quem teve trabalho foi apenas o efetivo policial que teve que ficar de olho num grupo de torcedores chilenos que invadiu o campo. Ao invés de voltarem para arquibancadas, os “inchas” ficaram camuflados atrás da placa de publicidade, esperando para comemora o feito do seu time.
O Brasil, que antes da partida pensava em mudar a data da viagem para a semifinal, teve que mudar foi o itinerário da viagem. O Chile chegou a final e perdeu o título para o Uruguai, mas ficou marcado na história. Já o Brasil caiu na primeira fase da competição, feito que viria a ser igualado uma semana depois do dia em que vimos esse jogo. E podemos assegurar uma coisa: aquele time de 87 fez menos feio. Apesar do balaio.
Ficha Técnica
LOCAL: Estádio Olímpico Chateau Carreras, em Córdoba, Argentina.
DATA: 03 de julho de 1987.
PÚBLICO: 15.000 pagantes
ÁRBITRO: Juan Cardellino (Uruguai)
CARTÕES AMARELOS: Edu Marangón
CARTÃO VERMELHO: Nelsinho
BRASIL – Carlos; Josimar, Júlio César, Ricardo Rocha (Geraldão) e Nelsinho; Douglas, Valdo, Edu Marangón (Romário) e Raí; Muller e Careca. Técnico: Carlos Alberto Silva.
CHILE – Rojas; Reyes, Astengo, Toro e Hormazábal; Pizarro, Mardones, Contretas e Puebla; Basay (Zamorano) e Letelier (Salgado). Técnico: Orlando Aravena.
Ficou curioso em ver o Brasil com jogadores da Portuguesa, Botafogo-RP e Guarani no time titular? Confira aqui o jogo:
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