A QUEDA SEM FIM DA PORTUGUESA
Quanto Ailton acertou o canto de Clemer e marcou o segundo gol do Grêmio no Olímpico, decretou o fim do sonho da Portuguesa. Era o adeus ao maior título da história da Lusa, que ficou a pouco mais de cinco minutos de ser campeã brasileira de 96. Foi triste, mas a campanha foi genial. Se fosse pelo regulamento atual a Lusa teria ido a Libertadores. Mas infelizmente hoje a realidade é diferente.
Primeiro, vamos contextualizar o fim dos anos 90 da Lusa e o seu desempenho na primeira década dos anos 2000. Nos anos seguinte a Portuguesa manteve boas campanhas – 4º lugar em 97 e 98 – mas uma campanha desastrosa em 99, 21º entre 22 times, manchou sua história, só não sendo rebaixada por causa da média de rebaixamento adotada na época. Baqueada, a Lusa virou coadjuvante nos anos seguintes, com um 17º lugar na João Havelange de 2000 e um 13º no Brasileirão de 2001.
Em 2002 não teve jeito, caindo junto com o Palmeiras. O Brasileirão se tornou de pontos corridos e a Portuguesa permaneceu na série B de 2003 até 2007, ficando no meio da tabela ou flertando com o acesso, mas sempre fracassando. Em 2007 ficou em terceiro e subiu. Porém em 2008 fez uma temporada ruim e foi rebaixada novamente. De volta a segundona passou raspando em 2009 e 2010, terminando em quinto. Em 2011 ganhou a Série B com sobras e voltou com muita empolgação para a elite. Mas a Lusa fez uma campanha pífia e terminou uma posição acima da zona de rebaixamento. Ai veio o fatídico campeonato de 2013.
Naquele campeonato a Lusa chegou a ter bons momentos, mas na reta final perdeu muito e terminou em 12º lugar com 48 pontos. Mas na última rodada do campeonato, a Portuguesa empatou com o Grêmio no Canindé por 0x0, afastando a chance de queda. Na verdade não foi bem assim. No segundo tempo, o jogador Héverton entrou em campo com a camisa 18 e marcou o início da queda vertiginosa da Portuguesa de Desportos.
Héverton estava sem condições de jogo e essa foi a deixa para que o Fluminense entrasse com um recurso no STJD, fizesse a Lusa perder 4 pontos e entrasse na zona de rebaixamento, salvando o time carioca, que então era o atual campeão nacional. Era o início de uma queda vertiginosa da equipe, desorientada por ter sido rebaixada no tribunal e não em campo. As tomadas de decisão não eram bem fundamentadas, os gastos eram discrepantes em relação ao patrimônio do time, que contraiu dívidas e vê agora o risco eminente de ter o Canindé ser leiloado.
Em três anos a lusa caiu da elite para a quarta divisão! A crise político foi agravada a cada fracasso. Teve três presidentes em três anos e, o atual, José Luiz Almeida, disse durante a última temporada que o clube não resistiria a uma queda para a série D. Segundo o auditor que analisou as dívidas da Portuguesa, “essas condições indicam a existência de incerteza significativa, que pode levantar dúvidas quanto a capacidade da continuidade operacional da entidade”. A situação é extremamente crítica. Dos três presidentes, dois caíram por pressões internas do clube, com direito a tentativa de impeachment.
Se quando acabou o jogo com o Grêmio (sempre presente na história recente da Lusa) o ano de 2014 estava encaminhado, com o dinheiro da TV e a visibilidade da elite, foi só o STJD decidir pelo rebaixamento que a crise teve início. A cota de TV, principal receita do clube, caiu de 19,8 milhões em 2013 para 5,6 milhões em 2015. O patrocínio também caiu de 3,7 milhões para 1,4 milhão no mesmo período, enquanto a torcida deixou de ir ao Canindé. Hoje o time arrecada 1 milhão de bilheteria, ao contrário dos 3,7 de 2013. Isso tudo levando em consideração, o período até 2015, quando o time jogou a série C, mas não foi rebaixado. Imaginem os dados deste ano, com a queda para a última divisão do campeonato nacional?
Além dos três rebaixamentos em quatro anos no Brasileirão, a Lusa caiu também no Paulistão, mostrando que o problema é crônico. E a administração também é desastrosa. Desde o rebaixamento em 2013, o clube teve 14 treinadores e contratou 96 atletas. O apocalíptico ano de 2016 foi um sinal claro disso, com o time terminando o ano sem nenhum jogador do elenco que atuou na primeira partida da temporada e com a base aos frangalhos.
A dívida do clube 315,3 milhões, assustadoramente mais alta que a receita de 13,7 milhões, o que faz com que o Canindé seja o principal alvo dos credores. Parte de sua área foi penhorada e será levada a leilão em novembro, num valor corresponde aos 45% do estádio que pertencem a Portuguesa. Tudo por um processo de um ex-dirigente que cobra 7 milhões de um empréstimo não pago, além de outras dividas trabalhistas no valor de 50 milhões, que podem ser incluídas. Para piorar, a Câmara de São Paulo quer vender os 55% que pertencem a prefeitura. A própria Lusa é a principal interessada na compra, mas precisa de um parceiro para arcar com os custos.
Mas mesmo enquanto ainda possui estádio, a Portuguesa fica sem torcida. O clube já não possuía uma media de público glamourosa em 2013, quando o Canindé recebia cerca de 5 mil espectadores em média. Mas, pelo menos, era garantia de um faturamento na casa de R$ 163 mil por jogo. No ano seguinte, quando disputou a série B e caiu para a C, o faturamento como mandante não passou de 23 mil. A salvação parecia estar no jogo contra o Vila-Nova, em 2015. Eram as quartas de final da série C e, caso o time vencesse o Vila Nova-GO, voltaria a série B. 17.282 lusitanos foram ao Canindé, num público que lembrou os tempos de elite. Mas o time não conseguiu o acesso. Depois disso nunca passou de 2.504 pagantes.
Mas alguns estavam dispostos a aparecer ao estádio, mas não para torcer. Momentos depois da derrota da Portuguesa para a Tombense por 2 a 0 em Tombos, que confirmou o rebaixamento do clube para a Série D do Campeonato Brasileiro, cerca de 40 torcedores invadiram e vandalizaram a ante-sala e a sala a presidência do clube, no Canindé. Até o momento, vemos o fundo do poço. Mas dá para piorar.
A Portuguesa está muito, mas muito longe, de seus momentos de glória. Lembrar de 96 pode até ser um alento para o torcedor, mas soa muito mais a melancolia e tristeza de quem vê a morte cada vez mais de perto. Resta torcer para que uma das equipes mais tradicionais do futebol paulista e brasileiro sobreviva ao seu mais duro momento.
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